As últimas seções do
livro de Êxodo concentram-se no Tabernáculo, no templo móvel dos israelitas no
deserto. No
centro deste tabernáculo, estava a arca que abrigava os ‘10 Mandamentos’. Portanto, é crucial entendermos a mensagem
daquelas duas tábuas, caso desejemos captar a essência do santuário. Será que aquelas tábuas esculpidas de rocha
continham apenas mandamentos, ou algo mais profundo? Na conclusão de seu longo comentário [1],
Ibn Ezra cita o Saadia Gaon afirmando que os 10 Mandamentos são as principais
categorias para todos os demais mandamentos restantes da Torá. Talvez essa categorização explique a
necessidade dos 10 Mandamentos: tendo em vista que Deus desejava que a nação
israelita passasse a considerar todos os mandamentos pós-sinaíticos como de
origem divina, a validação foi exigida, a fim de que os mandamentos futuros não
fossem vistos como meramente decorrentes do próprio pensamento de Moisés.
Os 10 mandamentos
ensinam não apenas conceitos importantes, mas também priorizam os mandamentos. Ibn Ezra explica que nosso relacionamento
com Deus se baseia mais em nossos pensamentos do que em nossas ações. No entanto, quanto ao homem, suas ações são
mais vitais do que seus pensamentos: uma lesão corporal é alvo de maior
preocupação do que um mero discurso ou pensamento. É por esta razão que nos 10 Mandamentos, os
cinco primeiros que lidam com a relação do homem com Deus, começam com leis que
regem o pensamento, então a fala e, finalmente, a ação. A ordem é invertida no segundo conjunto de
mandamentos, que começa com as leis que regem a ação, seguida a fala, e,
finalmente, o pensamento
Todas as ações do homem
caem em uma destas três categorias: pensamento, fala e ação. Quando dizemos que a relação primária do
homem com Deus é através do pensamento, é porque Deus não é físico. Assim, o nosso relacionamento com Ele não
pode envolver algo físico. Nós
nos relacionamos com Deus por meio de nossos pensamentos e convicções, e,
portanto, o nosso “conhecimento” acerca d’Ele é o mais vital. Isso explica por que o primeiro mandamento
– que é o mais importante - é o conhecimento acerca de Deus. A partir daqui os 4
mandamentos restantes diminuem de importância, embora sejam todos igualmente
fundamentais.
As relações humanas são
principalmente físicas. Portanto,
os piores crimes são aqueles em que danos corporais ocorrem. O assassinato está, portanto, na posição
número 1 da segunda lâmina de safira. O que se pensa sobre os outros é de menor
importância e, portanto, não desejar a esposa do próximo ocorre por último, na
segunda lâmina. Entendemos
a necessidade dos 10 mandamentos como um esboço para todas as leis da Torá,
como sugerido acima. No
entanto, que consideração exigiria tal categorização, separando os 10
Mandamentos em dois grupos, e que as leis entre o homem e Deus devam preceder
as leis entre o homem e seu próximo, sendo cada um dos grupos ordenados por
prioridade? Claramente
Deus não se limitou apenas a apresentar a Moisés todas essas leis. Ele também forneceu-lhe um sistema preciso. O que esse ‘sistema’ é pode ser
compreendido ao respondermos estas perguntas. Em geral, qual é o objetivo das categorias? Se presumirmos que a lei que ordena os
judeus a vestirem roupas melhores no dia de shabat é algo apenas para auto
engrandecimento, a mesma lei perde seu propósito. Mas se o judeu percebe que esta lei visa um
maior respeito para com o shabat, ele estará agora no caminho da compreensão do
verdadeiro propósito. Vestir-se
com as melhores roupas em um shabat, pretende gerar no judeu praticante um
maior respeito em relação ao dia. Em seguida, deve-se categorizar ou definir
a essência do shabat. Se
alguém pensa que é apenas um dia para descansar, novamente estará se
concentrando apenas em si mesmo, e não Deus. Mas se entende que o shabat tem a intenção
de recordar a criação, em seguida, estará a caminho de reconhecer o Criador, o
verdadeiro propósito do shabat. Além
disso, quando se percebe que a observância do shabat é colocada em primeiro
lugar na lâmina das leis entre o homem e Deus - isso aumenta o seu apreço e a
realidade de que o dia tem a ver com Ele. Assim, a categorização adequada nos oferece
maiores verdades. Definir
um quadro de 10 mandamentos é o mais alto nível de classificação. A separação entre as leis que se aplicam a
Deus e ao homem é outra categorização. Priorizar esses dois conjuntos de leis é
uma terceira categoria. Para
possuir o mais alto nível de conhecimento sobre qualquer lei, é preciso
primeiro saber o objetivo da lei: o desempenho simples é claramente
insuficiente. É
preciso discernir se uma lei tem como alvo maior o conhecimento de Deus, ou se
ele aborda inseguranças através de atos supersticiosos e idólatras, procurando
garantir o seu futuro. Ou
seja, essa lei cai como o mandamento # 1 ou # 2 no conjunto de leis entre o
homem e Deus. Saber a categoria adequada também direciona
melhor os nossos estudos.
Assim, os mandamentos não são ordenados apenas por ordem de importância, mas
esta ordem de importância diz respeito a uma priorização lógica.
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OS 10 MANDAMENTOS
OFERECEM MUITAS LIÇÕES VITAIS
1) Eles validam todas as
leis pós-sinaíticas como sendo de origem divina
2) As duas lâminas de
safira transmitem a distinção entre duas áreas de conhecimento: verdades sobre
Deus e as leis sociais, que servem apenas para garantir sociedades estáveis, para
que todos possam conhecer a Deus.
3) Estas 10 categorias
pretendem nos dirigir a fim de que apliquemos uma categorização em nossos
estudos, de modo a que possamos chegar a verdades mais precisas.
4) A priorização de uma
lei sobre a outra, nos ensina que o conhecimento é um processo de construção: o
conhecimento mais fundamental é a base para outras áreas.
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Tão crucial é este
‘padrão’ aqui demonstrado para a compreensão da verdade, que podemos percebê-lo
mesmo entre nossos maiores pensadores. Maimônides começa o seu Mishneh Torah com
os "fundamentos", e Aristóteles começa com suas
"Categorias". Deus concedeu inteligência ao homem. Ele projetou nossas mentes para que
funcionássemos de determinada maneira. Em seguida, Ele nos deu Sua Torá,
inicialmente com apenas os ‘10 Mandamentos’, uma “ferramenta” que carrega um
design que não só nos transmite fatos, mas por sua própria concepção,
representa o sistema de aquisição de conhecimento. ■
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Nota:
[1] Ex. 20: 1, pouco antes de iniciar seu
comentário sobre 20: 3.
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